A mente está viajando e já estou em Paris. Saí de Manaus para ver a Copa do Mundo de Futebol da Espanha e, depois de viajar em um Jumbo da Air France, saído de Manaus, cheguei à Cidade Luz. Peguei um ônibus no Aeroporto Charles De Gaulle e fui para o hotel onde o Dudu e o Sr. Edgar Monteiro de Paula haviam acampado para acompanhar a Tia Helena, em tratamento, no Hospital Gustav Roussi. Paris era o pit stop das equipes de torcedores de todo o mundo que iriam para a Copa. Evandro Farias, Luiz Saraiva, Amazonino estavam prontos para tomar um banho de Europa com sabões franceses. Passamos pelo Louvre, Torre Eiffel, Arco do Triunfo, Champs Eliseé, Boulevard de Capucine, onde vimos Fritzcarraldo, filmado em Manaus e apresentado pela primeira vez em Paris.
O mundo inteiro estava passando por Paris para chegar à Espanha. Os africanos, os sul-americanos, os americanos (Henry Kyssinger assistia às copas do nosso ladinho), todos os europeus e já começavam a aparecer as grandes torcidas de japoneses, coreanos e chineses. Os russos, ainda hermeticamente fechados em um regime que só eles entendiam, eram uns marcianos. Todos olhavam para eles e, mesmo com antenas nas cabeças, a alegria e a felicidade de estar em Paris e vivendo o clima de Copa do Mundo, irradiavam um esquecido bom humor.
O mundo foi ao Moulin Rouge onde descobrimos que o soutien já era uma peça que servia para qualquer coisa, menos para ser usada em ambientes alegres. Depois do show, ainda extasiados, dormimos o sono dos justos.
Pegamos um jatinho, desses que aterrissam até em aeroclube, e fomos para a Espanha. Passamos por Torremolinos e desembarcamos o Arnaldo Santos, copeiro dos mais assíduos, e seguimos para Puerto Banus, onde a Charufe fazia apresentações, cantava e encantava no cassino local, e jogamos os nossos corpos em um hotel, à beira-mar, na belíssima cidade de Marbella. Chegamos, entramos no hotel, desabamos em nossas camas e, no outro dia, sentimos que o hotel era uma antiquíssima fortificação dos mouros.
Aí vimos o que era um clima de Copa do Mundo de Futebol. Grupos de africanos com camisas de suas seleções, enrolados em bandeiras, abraçando e dando souvenires de suas terras para todos os torcedores que passavam ao lado. Aquela Babel da alegria seguia contagiando a todos e paramos ao encontrar os escoceses. Eram centenas, todos cantando aquelas músicas de guerra que vemos nos filmes, e mesmo tristes, eram engraçadíssimas quando entoadas por um coral que pegaria fogo se acendessem um fósforo pelo meio deles. Os escoceses iam caindo e a cada duzentos metros víamos montes de seis ou oito desmaiados, sendo aliviados por brasileiros que escolhiam os melhores tênis e, após a certificação do que era melhor, iam atrás de outros . A polícia acabou com a brincadeira no segundo dia.
No primeiro jogo, Evandro, Dudu e eu, estávamos na primeira classe. Sabem onde era a primeira classe? À beira do campo, onde antes ficavam os “geraldinos” no Brasil. Ficamos loucos pois estávamos acostumados a ver o jogo de cima, das nossas cadeiras ou das arquibancadas. A Revolução Francesa II havia começado e partimos para níveis inferiores que consistia em subir. Fomos proibidos por todas as maneiras conhecidas e resolvemos escalar as arquibancadas, por dentro, ao descobrir que eram tubulares, dessas invenções arrumadinhas que se faz muito em desfiles de Escolas de Samba. Galgamos os níveis e saímos no meio da torcida da União Soviética vestidos com a amada e inigualável “amarelinha”. Fomos saudados pelos russos e por muitos espanhóis que brincavam de ser comunistas. Ganhamos sanduiches, vinhos, bocadillos, doces e eu já estava pensando em ser espanhol. O tratamento de Copa é outra coisa. Comunistas, socialistas e democratas, em uma Copa do Mundo, são apenas copeiros. Quando o brasileiro Luizinho cometeu um pênalti absurdo, passaram dois minutos gritando ladrões nos nossos ouvidos e, como ríamos e batíamos palmas, passaram a nos embebedar com vinho e whisky. Alegria, Alegria! como nos fez acreditar o Caetano Veloso.
Pois é, isso tudo para anunciar aos milhares de leitores que nos acompanham que a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) anunciou que autorizou, no dia 22 de maio de 2014, nove mil e quatrocentos novos voos no espaço aéreo brasileiro. Nenhuma dessas novecentas mil pessoas perguntaram se o PIB do Brasil está em alta ou em baixa. O engraçado é que os mesmos copeiros também não perguntaram se estamos estudando em boas ou más escolas, ou se nós temos hospitais atendidos por cubanos ou portugueses. O que eles querem é deixar, no mínimo, quinhentos dólares em três dias de permanência por aqui, para o comércio das sedes comemorarem. Educação, saúde, corrupção e segurança serão problemas só nossos, que serão resolvidos por nós, nos próximos séculos e que a Fifa foi responsabilizada, apenas, por errar em fazer a sua última Copa do Mundo em país de terceiro mundo.
Eu só quero dizer que retribuirei a irmandade e a educação dos nossos patrícios portugueses que invadiam as cidades espanholas para torcerem pelos brasileiros, totalmente uniformizados de verde-amarelo, somente com um chale com as cores da bandeira portuguesa. Assistirei aos jogos de Manaus com a camisa e a bandeira de Portugal e só não usarei o chale porque não sou português para usar chale em Manaus.
A Copa está aí e imploro que aproveitem a oportunidade de participar do maior evento de confraternização da Terra.
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Roberto Caminha Filho, economista e nacionalino, é mais um português em Manaus.