Este ano a Zona Franca de Manaus (ZFM) completa 50 anos de existência. No dia 28 de fevereiro de 1967 foi assinado o Decreto Lei 288/67 pelo presidente militar Humberto de Alencar Castello Branco. O artigo 1º do Decreto, diz que a “ZFM é uma área de livre comércio de importação e exportação e de incentivos fiscais especiais, estabelecida com a finalidade de criar no interior da Amazônia um centro industrial, comercial e agropecuário dotado de condições econômicas que permitam seu desenvolvimento, em face dos fatores locais e da grande distância, a que se encontram os centros consumidores de seus produtos”.
A Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA), administra os incentivos fiscais, concedidos aprovação de projetos das empresas que se instalaram em Manaus. São em torno de 500 empresas, gerando um faturamento de R$ 80 bilhões (2015) e milhares de empregos diretos e indiretos. Em 2014, chegou a ter 122 mil empregos diretos. Hoje está em torno de 90 mil. Mas o que vimos ao longo desse meio século de funcionamento da ZFM, é que as atividades industriais, comerciais e de serviço ficaram concentradas na capital e poucas atividades foram desenvolvidas no interior do Estado.
O setor comercial, importador da ZFM floresceu, nos primeiros anos, porém foi o setor industrial que tornou-se a grande alavanca da economia do Amazonas, por meio do Distrito Industrial. O setor agropecuário não foi para frente. O próprio Distrito Agropecuário, com muitas terras disponíveis, tem poucos resultados. O certo é que a economia do Amazonas depende totalmente da ZFM. O Estado tem um orçamento médio de R$ 15 bilhões por ano. Em torno de R$ 7 bilhões vem de ICMS oriundo da atividade industrial e comercial concentrada em Manaus, cerca de R$ 1 bilhão vem dos fundos (FMPES, FTI e UEA) e R$ 7 bilhões de transferências federais e convênios e empréstimos.
Quando há uma diminuição do faturamento do Polo Industrial de Manaus (PIM), há consequente redução da arrecadação estadual, comprometendo os serviços essenciais destinados à população, como estamos vendo nestes dois últimos anos. Há muita indecisão política, por isso a necessidade de discussões e ações sérias quanto a desenvolvimento de outras atividades produtivas no Estado. Aqui cada governante tem o seu projeto, de caráter eleitoreiro, mas sem planejamento de longo prazo.
O grupo político que governa o Amazonas há 33 anos não conseguiu criar novas alternativas. Nesse tempo, cinco governadores se revezaram no poder. Mestrinho falava na “caça aos jacarés”, Amazonino inventou o Terceiro Ciclo, o Eduardo Braga prometeu a Zona Franca Verde, o Omar Aziz inventou o Amazonas Rural, e o governador Melo lança agora a Nova Matriz Econômica e Ambiental.
E quais os resultados? Quantas fábricas estão instaladas no interior beneficiando, industrializando produtos da nossa biodiversidade? Até o peixe não tem produção para atender a necessidade da população e sobrar excedente para venda para fora do estado. Ainda trazemos de outros estados peixe, farinha de mandioca, farinha para tapioca, banana, laranja e tantos outros produtos que poderiam ter produção local. O que é uma vergonha!
Mesmo sendo a base econômica do Estado, a ZFM sofre constantes ataques, principalmente do estado de São Paulo. No governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB), quase acabam com a ZFM. Os incentivos iriam terminar em 2013. Foi o presidente Lula (PT) que fortaleceu a ZFM prorrogando os incentivos por mais 10 anos, até 2023. E depois, em 2014, a presidenta Dilma Roussef (PT) prorrogou por mais 50 anos. Ou seja, têm incentivos até o ano de 2073.
Temos que aproveitar esses incentivos para alavancar novos horizontes. Quais são as atividades prioritárias? Quais tem menos impacto ambiental, e possam gerar empregos e renda? O turismo, a produção de alimentos (peixe, por exemplo) em grande escala, os produtos da biodiversidade podem crescer? Vale a pena a exploração mineral, principalmente em terras indígenas e reservas ambientais? Quais são os ganhos e prejuízos? E nesse sentido, qual o papel do Centro de Biotecnologia do Amazônia (CBA) e dos recursos de Pesquisa e Desenvolvimento (P&D), oriundo das empresas do PIM? É um caminho, junto com as universidades nas pesquisas voltadas para ao setor produtivo? Acredito que sim.
Uma grande dívida da classe política do Estado é a falta de infraestrutura. A maioria dos municípios não tem portos e aeroportos autorizados, o transporte fluvial não foi regulamentado e há pouquíssimas linhas áreas. A falta de energia de qualidade e de comunicação via internet, são fatores que limitam totalmente o desenvolvimento. A ZFM tem um papel na Amazônia Ocidental (AM, RR, RO, AC) e Amapá. Exceto em Manaus/AM, nos demais estados a SUFRAMA se limita a administrar Áreas de Livre Comércio (apenas comércio importador). Nestes estados, apenas indústrias que se utilizam de matéria prima regional recebem incentivos fiscais. São poucas. Por isso, também, o desinteresse dos políticos desses estados em defender e também fortalecer a atuação da Suframa.
Ainda em relação à Suframa, várias questões ainda estão abertas. A expansão do Distrito Industrial e a urbanização dessas áreas para instalar mais empresas. Algumas áreas já estão sendo ocupadas de forma irregular para moradias. A manutenção das ruas do Distrito Industrial é motivo de querelas. Entendo que a Prefeitura é responsável, visto que todas as empresas pagam IPTU. E a destinação dos recursos próprias da Suframa, oriundo de taxas cobradas pelos serviços. A luta é para que esses recursos possam ser investidos na região.
Muita precisa ser feito. A discussão precisa ser técnica e a decisão política. A bancada do Amazonas é pequena (somente oito deputados e três senadores) e inoperante, pensando apenas em si, e no momento eleitoral. Precisa haver uma articulação entre bancadas regionais para defender o desenvolvimento regional. Não podemos tratar a ZFM apenas no momento eleitoral e sua administração ficar a mercê da indicação política de algum governador ou senador de “plantão”.
É hora de ouvir toda a sociedade para discutir o modelo da ZFM e suas mudanças, bem como novas alternativas econômicas.
José Ricardo Wendling é formado em Economia e em Direito. Pós-graduado em Gerência Financeira Empresarial e em Metodologia de Ensino Superior. Atuou como consultor econômico e professor universitário. Foi vereador de Manaus (2005 a 2010), deputado estadual (2011 a 2018) e deputado federal (2019 a 2022). Atualmente está concluindo mestrado em Estado, Governo e Políticas Públicas, pela escola Latina-Americana de Ciências Sociais.
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